Priscylla de Lêu

"Olha as estrelas. Enquanto elas brilharem haverá esperança na vida"  Érico Veríssimo

Textos


Desde criança sempre tive uma relação conflituosa com o tempo, nunca entendi o porque que nunca consigo andar a frente dele, mas sempre observei que quem consegue se eterniza, parece dominá-lo. Tenho a sensação de não pertencer ao tempo presente.
 
Em dezembro de 2013, tive a oportunidade de andar de barca Rio – Niterói, coisa que fiz há quase 25 anos, não ia muito a Niterói. Só ando de carro devido ao meu bairro não ter transporte público, porém fico sempre vivendo por horas num mundo particular, solitário, as músicas que ouço são todas do século XX, me visto como no século XX, porém no dia que andei nas barcas observei e me senti constrangida, pois estava completamente fora de moda, não me enquadrava nos padrões atuais, procurei sentar em um canto, para aguardar a barca, para que ninguém me notasse, então eu percebi uma coisa: Apesar de ter muita gente, tudo estava silencioso, as pessoas não se falavam, não se olhavam, cada uma estava com seu tablet, iphone, celular, ou seja, a mesma solidão que sinto no meu carro agora é coletiva, me senti no século XXI naquele instante e entendi porque me senti tão constrangida, pq sou uma mulher que vive em dois tempos! 

Será que esse século XXI trouxe muita informação e pouco conhecimento, e não estávamos preparados para isso? E no século XX tínhamos conhecimento, ainda que restrito, e o acesso à informação era complicado? Não sei, só sei que senti saudades do século XX naquele instante porque lá eu tinha meus pais mais jovens, usufruía da presença da minha avó, e tinha meus amigos, que sempre que podíamos estávamos juntos. Eu tinha sonhos, que curiosamente nunca se realizaram: ter um Puma conversível, um emprego dos sonhos, mas quando cheguei no século XXI de mãos vazias, era para eu ter desconfiado que tudo que sonhei foi errado, absolutamente toda minha vida estava errada! Durante toda uma década achei que minha vida tinha sido na verdade uma perda de tempo! É o tempo... sempre ele... por que que esse senhor insiste em me perturbar?Mas então eu pensei: Não sou culpada por sonhar errado e fazer tudo errado, nem fracassada, apenas sou vítima do meu tempo! Século XX.

 Retornando para as barcas, No momento que entrei sentei perto da janela e percebi que tive sorte, quando ela começou a andar eu fechei os olhos e fiquei prestando atenção no barulho do mar batendo no casco e senti um prazer indescritível, então notei que viver no século XXI é bem mais fácil que no século passado, não é necessário ter sonhos, basta apreciar a beleza do silêncio, cuidar da saúde e ser um ser humano que valha a pena conviver, e o resto... Quem precisa de resto? O nome já diz:  é resto! Ninguém precisa de resto pra viver.

Se eu já amava a música do Aldir Blanc “resposta ao tempo” Agora eu amo ainda mais, pois sei que o tempo tem vantagens sobre mim, “ele sabe passar e eu não sei” mas eu tenho o direito de optar “se ele aprisiona, eu liberto” e cabe só a mim, somente a mim, optar se quero viver aprisionada num tempo passado ou me libertar e escrever uma nova história.

Que venha o século XXI !!!

Ah sim ! Andar nas barcas Rio-Niterói se tornou um vício.
Priscylla de Lêu
Enviado por Priscylla de Lêu em 13/08/2014
Alterado em 13/08/2014
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